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22/08/2016

Diretor da Oi pagou mais de R$ 50 milhões para advogado fraudar clientes, diz PF

O advogado Eurico Teles nunca foi sócio de uma grande banca do país, mas é figura de prestígio, daquelas capazes de impulsionar a carreira de juristas. Marcus Vinícius Furtado Coelho foi alçado ao posto de presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) depois de uma ostensiva campanha apadrinhada por ele. No Superior Tribunal de Justiça, o ministro Benedito Gonçalves refere-se a Eurico como “meu irmão branco”; em retribuição é chamado de “meu irmão preto”. O “irmão branco” apoiou a candidatura de Gonçalves a uma vaga no Supremo Tribunal Federal. Como diretor jurídico da operadora de telefonia Oi, Eurico contratou a mulher de Gonçalves, Santina, como advogada da empresa no Distrito Federal. Há 15 anos na Oi, ele sobreviveu a sete presidentes. É o único a chamar por “Carlos” o controlador da empresa até 2013, Carlos Jereissati, responsável por sua contratação.

Quando a Oi foi criada, a diretoria jurídica e a presidência foram escolhas de Jereissati. Para as áreas de engenharia e financeira, as cabeças eram escolhidas por Otávio Azevedo, presidente da Andrade Gutierrez, que detinha outra fatia de controle da empresa. Preso pela Operação Lava Jato, hoje Azevedo usa tornozeleira eletrônica. Na semana passada, o bem menos conhecido Eurico sentiu o desconforto da acusação.

O Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, abastecido por uma investigação da Polícia Federal, o denunciou por formação de quadrilha, estelionato, patrocínio infiel e lavagem de dinheiro. Na peça apresentada à Justiça na terça-feira, dia 16, Eurico e outras três pessoas são acusadas de ter participado de um esquema de estelionato que, segundo a PF, lesou mais de 30 mil pessoas no estado. É suspeito de mais que isso, de contribuir para fraturar, por dentro, o casco da Oi, o gigante que exibiu um rombo de R$ 65,4 bilhões em um pedido de recuperação judicial apresentado neste ano.

O esquema consistia em subornar um escritório de advocacia que defendia mais de 13 mil clientes em ações contra a companhia, em troca do encerramento das ações judiciais. Em vez de enfrentar os clientes, era mais fácil comprar seu defensor. A ação começou quando Eurico Teles foi convocado a propor soluções para reduzir o tamanho do passivo da Oi, fruto de sua criação. Em vez de manter a estratégia de tentar reduzir na Justiça os valores das ações judiciais, usada até ali, Eurico preferiu contratar o tal escritório, do advogado Maurício Dal Agnol. Ele se destacara por conseguir bloquear várias ações na Justiça estadual. Pelo acerto, a Oi se comprometia a pagar R$ 50 milhões a Dal Agnol para que os processos de seus clientes fossem encerrados por 50% do valor já depositado pela própria empresa em juízo, à época R$ 638 milhões. Desta forma, a Oi conseguiu recuperar cerca de R$ 300 milhões.

As investigações que descobriram as fraudes em ações judiciais contra a Oi alcançaram Eurico depois que a Polícia Federal apreendeu, em 2014, um contrato particular firmado por ele e por Dal Agnol. O delegado Mario Luiz Vieira, da PF de Passo Fundo, mantinha 200 inquéritos abertos para investigar fraudes nas disputas com a Oi no estado. O esquema foi desmontado quando a PF deflagrou a Operação Carmelina, em fevereiro de 2013. O nome é uma homenagem a uma das clientes do advogado, que morrera de câncer sem ter recebido o dinheiro que a Justiça lhe determinara. Em uma ação de busca e apreensão, os policiais descobriram uma sala secreta na casa de Dal Agnol. Lá estavam pilhas de documentos sobre seus negócios com a Oi, inclusive o contrato firmado com Eurico Teles para garantir a vitória nas ações judiciais.

Ao longo da investigação, a PF descobriu que circularam entre 2009 e 2013 R$ 2 bilhões pela conta do escritório e de empresas de fachada de Dal Agnol, sendo que apenas uma ninharia foi repassada aos acionistas minoritários da Oi. Assim, Dal Agnol decidiu ficar com muito mais que os R$ 50 milhões firmados em contrato. Ele embolsou boa parte dos outros R$ 300 milhões que serviriam para ressarcir seus clientes, cujas ações, em muitos casos, já haviam transitado em julgado. O destino desse dinheiro ainda será rastreado. Assim, durante a negociata, a Oi também era lesada porque, estranhamente, em alguns casos o “acerto” com os advogados saía mais caro que a ação.

Segundo os investigadores, Dal Agnol conseguiu a proeza porque, como advogado das partes autoras, tinha a prerrogativa de movimentar alvarás em nome de seus clientes. Inclusive alvarás que permitiam o saque de depósitos judiciais feitos pela Oi . Era um negócio fácil para ele e Eurico. Um funcionário de Dal Agnol percorria o estado em busca de donos de antigas linhas telefônicas e os convencia a processar a Oi. Depois era só negociar o valor das ações com a Oi. Alguns processos de clientes lesados por Maurício Dal Agnol e, consequentemente, pela Oi também foram parar na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) depois que um dos conselheiros fiscais da empresa questionou os valores pagos em ações judiciais. A reclamação foi convertida em inquérito administrativo que tramita na autarquia.

Procurada por ÉPOCA, a Oi afirmou, por meio de nota, que o “departamento jurídico da empresa ainda não foi cientificado, formal ou informalmente, acerca do ajuizamento de uma ação penal”. A Oi diz que seus advogados recebem a informação com “estranheza”, pois, “por diversas vezes, os órgãos investigativos” afirmaram que a operadora ou seus representantes legais não eram investigados. A Oi diz que sempre atendeu aos pedidos de informação feitos pelos investigadores.  O advogado Maurício Dal Agnol não respondeu aos pedidos de entrevista.

Fonte: http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2016/08/diretor-da-oi-pagou-mais-de-r-50-milhoes-para-advogado-fraudar-clientes-diz-pf.html