Presidente da CBF por mais de 20 anos, Ricardo Teixeira - com sua conhecida arrogância - gostava de dizer que dispensava patrocínios do governo ou de estatais porque não queria a CBF, "uma entidade privada", como sempre frisou, sob fiscalização de órgãos públicos. A CBF só buscava patrocinadores privados - e, a cada mudança de patrocínio, surgiam denúncias e relatos de negociatas e propinas. Foi assim no contrato da CBF com a Nike, agora também alvo das autoridades americanas; foi assim na substituição da
Coca-Cola pelo Guaraná Antártica como patrocinador da seleção brasileira. Nunca houve investigação mais profunda por aqui: Teixeira tinha razão. No Brasil, ao contrário do senso comum, os crimes contra o patrimônio público são muito mais investigados do que os crimes no mundo corporativo.
Teixeira assumiu a presidência da CBF em 1989 - um ano depois da promulgação da Constituição de 1988, um marco da nova democracia brasileira. De lá para cá, viu os órgãos de fiscalização pública aumentarem sua atuação. Controladoria Geral da União, tribunais de contas, o Ministério Público independente, com o procurador-geral eleito por seus pares: as verbas públicas estão cada vez mais vigiadas e as denúncias contra gestores cada vez mais comuns. Ricardo Teixeira sempre achou que a CBF só com parceiros privados mantinha a entidade longe da fiscalização. Renunciou à direção da CBF antes da explosão dos escândalos dos trens de São Paulo e da Lava Jato na Petrobras. Nos dois casos, empresas - brasileiras e estrangeiras - foram flagradas em práticas criminosas: formação de cartel, pagamento de propina, superfaturamento de obras e compras. Ainda assim, são investigadas por negócios com o setor público.
A maior lição da investigação do FBI e da Receita dos Estados Unidos, país que preza a livre iniciativa e o capitalismo, sobre os negócios do futebol para o Brasil é desmoralizar a filosofia de Teixeira. José Maria Marin e os outros cartolas são acusados de extorsão a empresas, corrupção (cobrança de propinas em negócios particulares) e lavagem de dinheiro. Não há verbas públicas envolvidas: há uma bandalheira com dinheiro de particulares, o que naturalmente afeta empresas, seus acionistas, o sistema financeiro. Nossas empresas nacionais acostumaram-se aos benefícios e ao protecionismo do capitalismo à brasileira, que sempre facilitou monopólios, acordos e corrupção. Para desmascarar as negociatas do futebol brasileiro, é preciso copiar a lição americana e investigar os trambiques empresariais: a lavagem de dinheiro, como mostra a Lava Jato, é o fio da meada. Vai fazer bem ao futebol brasileiro e ainda pode dar um choque de capitalismo nos capitalistas nacionais.
Fonte: Correio da Bahia